Na época do
descartável, o velho torna-se supérfluo. Sem utilidade e valor livros
antigos, televisão fora de linha, máquinas fotográficas e gibis são
diariamente jogados fora. Contudo, o que não tem valor para alguns, para
outros são verdadeiros tesouros, como para o reciclador Cincinato
Azevedo de 61 anos.
Quem diria que a primeira máquina fotográfica fabricado no Brasil
da Kodac, modelo “Rio 400”, seria encontrado no lixo. Verdadeira
relíquia para os colecionadores. Outro tesouro é o livro de matemática
de 1931 do professor Cecil Thiré. Catedrático teve seus livros aceitos
em todo o Brasil durante décadas. Este e outros objetos estão amontoados
na casa do senhor Cincinato, também conhecido como Nato. “As pessoas
não tem noção que esses objetos carregam um valor histórico”.
Nato é reciclador há mais de quinze
anos. Ex-jornaleiro, não se conforma com a ideia das pessoas jogarem
fora objetos e livros em bons estados de uso. A casa onde mora está
tomada de artefatos que encontra pela rua como cadeiras, dicionários,
mesas, armários, fita cassete, fotos.
“O que mais encontro pela rua e nos lixos é dicionários de português e
língua estrangeira. Estou cheio deles na minha casa”, fala lamentando-se
diante da situação que a educação vive atualmente.
RECICLAR É PRECISO
Um dos grandes desafios do mundo moderno é a
capacidade de reutilizar produtos que hoje são jogados fora. Nato tem
consciência do trabalho que desenvolve, mas diz que encontra obstáculos
para desenvolver a atividade. “São poucos os moradores sensíveis ao
esforço do reciclador”, e argumenta: “A reciclagem é o único caminho
para as cidades, pouco importa o tamanho da região. Em breve não haverá
mais espaços para tanto lixo e objetos descartados. As prefeituras
amenizariam o problema reservando áreas para o descarte de livros,
aparelhos elétricos e eletrônicos e tudo o que pudesse ser reaproveitado
em pouco tempo”.
Na casa dele não há mais espaço, parou de
recolher objetos há seis meses. O espaço que ainda resta é um estreito
caminho para a entrada da casa. Só de bonecas e Nato conta que tem mais
de sessenta. Ursinhos quase uns quarenta de variados tamanhos: grandes,
enormes, pequenos, médios e diz inconformado. “Antes de jogar fora uma
boneca, por que não doar para uma criança? Tanta criança na rua
precisando de um brinquedo. Isso é uma questão de humanidade antes de
tudo, de amor ao próximo”, afirma.
Antes de ser reciclador e
ex-jornaleiro, Nato vendia livros na Praça da República. Homem
articulado e bastante comunicativo chegou a Belém na década de 1980. Diz
que hoje é mais paraense do que carioca. Músico e poeta conhece
o valor dos vários livros que encontra. “Eu encontrei esse livro
[mostra o livro de ‘Os Lusíadas’, de Camões] no lixão e perto dali tem
uma escola, vai ver se na biblioteca dessa escola tem um livro
desses?”.
Na casa dele há vários livros de
biografias de personalidades de escritores, artistas e políticos do
Brasil e do Mundo como do escritor Oscar Wilder. Gibis da turma da
Mônica têm oitenta, além de postes de bandas de rock como do Guns
‘N’Roses e uma curiosidade, um livro do Harry Potter todo em japonês.
Outra curiosidade encontrada por ele são dois diários pessoais.
Autobiografias contadas com muita imaginação e criatividade. Um deles é o
diário de Burke, um jovem que conta sua vida através de quadrinhos de
faroeste. No diário pessoal para cada membro da família
há um nome americano. Um dos trechos diz, “Eu adoro os filmes de
faroeste”, eis a explicação para contar os dramas e alegrias da vida
pessoal por meio das aventuras de um caubói imaginário.
“Essa história dava um filme”, conta Nato em meio aos livros que recolhe.
(Diário do Pará) Sexta feira - 19/04/2013
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