Milhares de estudantes abandonam o Ensino Superior, os que ficam
endividam-se e os mais pobres nem conseguem chegar a entrar. Qual a
solução para esta situação? Reduzir a comparticipação das famílias no
financiamento do ensino? Alargar as bolsas de estudo a todos os que dela
precisam? Acabar com a política de propinas e orientar as políticas
fiscais para o financiamento das instituições? Investir na ação social
indireta? Não. Para o governo nada disto é uma opção e encontrou a
solução milagrosa: institucionalizar dois tipos de Ensino Superior, um
para ricos, um para pobres.
O governo prossegue a sua encruzilhada contra o Ensino Superior. Depois
das sucessivas alterações às regras de atribuição de bolsa de estudo,
de não rejeitarem um aumento extraordinário das propinas proposto pelo
FMI, depois de terem empurrado milhares de jovens para empréstimos
bancários para poderem continuar a estudar e depois de terem convidado
os jovens a emigrarem e deixarem o seu país, o governo vem agora propor
uma institucionalização da desigualdade de percursos no Ensino Superior.
Trata-se, fundamentalmente, de criar cursos de apenas dois anos, muito
mais adaptados à lógica empresarial, para os estudantes que vêm de
cursos profissionais. O que acontece é que porque a escola continua, em
grande medida, a fazer depender o sucesso escolar da origem social dos
alunos e porque o governo tem uma estratégia de empurrar os estudantes
mais pobres para os cursos profissionais, institucionaliza-se uma lógica
de percurso escolar marcado profundamente pela desigualdade. Se és um
estudante com menos rendimento e com menos recursos culturais na
família, o estado orienta-te imediatamente para cursos profissionais que
depois te darão a possibilidade de tirar um curso no politécnico de
dois anos, criado por empresas. Se és um estudante com mais rendimento e
recursos culturais em casa, poderás (ainda que cada vez com menos
certeza) prosseguir os teus estudos como um “aluno normal” e ingressar
no regime normal de Ensino Superior.
O que se trata aqui é de criar todas as condições para que o estado e a
escola desistam de contrariar a forma como as desigualdades sociais se
encrustam e reproduzem nas instituições sociais.
Ainda que esta seja uma proposta permeável no senso comum, só podemos
reafirmar que o Ensino Superior tem de estar aberto a todos os
estudantes e não criar as condições para um Ensino Superior de primeira,
e um Ensino Superior de segunda. José Manuel Pureza escreveu há pouco
tempo que a configuração ideológica que estava por detrás das propostas
do governo para o ensino profissional era a institucionalização de uma
escola da desigualdade. Tinha razão nessa altura, só que agora o governo
levou esse projeto também para o Ensino Superior.
Com Bolonha a formação de primeiro ciclo passou de cinco anos para
três. Agora o governo pretende passar alguns cursos para dois. Se
somarmos a isto as consequências da dita “racionalização da rede do
ensino superior”, cuja consequência na maioria dos casos é o
encerramento e fusão de instituições com o objetivo de limitar a oferta e
as vagas do Ensino Superior, percebemos que só derrubando este governo é
possível parar o seu projeto ideológico. É essa a responsabilidade de
uma esquerda para quem os juros agiotas não estão à frente do serviço
público de educação, de uma esquerda para quem o Ensino Superior é uma
prioridade central, de uma esquerda para quem a finança não está à
frente das pessoas.
João Mineiro
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