"Síndrome do carro na garagem" atinge sobretudo mulheres. Profissionais especializados tratam a amaxofobia.
Pisar
no acelerador, trocar de marcha, dar seta, prestar atenção no veículo
de trás e não deixar o motor morrer pode ser tarefa automática para
milhões de pessoas diariamente, mas para outras é motivo de pânico.
Entre o total de vítimas da chamada "síndrome do carro na garagem", 85%
são mulheres, entre 30 e 45 anos, e 15% são homens, de acordo com
pesquisa regida pela psicóloga Neuza Corassa, autora do livro "Vença o
Medo de Dirigir", que já está em sua 13ª edição, e diretora do Centro de
Psicologia Especializado em Medos (CPEM), em Curitiba.
Endossava
essa porcentagem a bancária Jandira Amaral, 60, que só tomou coragem
para dirigir 25 anos depois de receber sua carteira nacional de
habilitação (CNH). Antes disso, a carteira era apenas um documento que
servia como comprovante de identidade ou CPF. "Quando saí do exame,
estava muito motivada. Mas, assim que peguei no volante fora da
autoescola, só fui criticada pelo meu marido. Eu não tinha liberdade de
conduzir do meu jeito, o que acabou gerando um bloqueio, como se nada do
que eu fizesse fosse bom o suficiente", conta.
Esse,
inclusive, é um dos perfis mais comuns entre as pessoas com medo de
dirigir: confiáveis, organizadas, detalhistas, sensíveis, inteligentes e
não muito abertas a críticas. "Gente com esses traços de personalidade
não se permite errar. Mas a verdade é que dirigir é um aprendizado como
falar, andar, ler e escrever, ou seja, é preciso praticar e respeitar
seu próprio tempo. Vinte aulas não estão nem perto do mínimo para se ter
domínio, é apenas o começo", ressalta Cecília Bellina, psicóloga
especializada em comportamento motorista e dona da clínica e escola
"Perca o Medo de Dirigir", em São Paulo.
É possível que os
atingidos pela amaxofobia - esse é o nome técnico para o pavor de
dirigir - tenham sido criados na época em que os automóveis eram
relacionados à figura masculina ou sofrido algum grande trauma. "No
entanto, esse é o menor grupo. O que foi constatado é que o trauma é
apenas um aval para a pessoa continuar se encondendo atrás do medo e ser
mais bem compreendida pela sociedade", alerta Neuza.
Como vencer o problema
Autoconhecimento e autocontrole são fundamentais. Permita-se errar e procure ser menos exigente, afinal, você está aprendendo.
Faça exercícios físicos ou relaxamento muscular para o corpo produzir
endorfinas capazes de neutralizar a química da ansiedade, chamada
noradrenalina.
Aproxime-se de seu carro dentro da garagem. Comece aos poucos: entre, ajuste o banco e familiarize-se.
Ainda dentro da garagem, ligue o automóvel e leve-o para a frente e para trás.
- Dê uma volta
no quarteirão, de preferência em horários sem movimento e em ruas
tranquilas. Quando perceber que a ansiedade durante o percurso é nula,
ande por dois quarteirões e, então, pelo bairro.
Marque em sua agenda pelo menos duas vezes por semana para conduzir seu
carro,como se fosse uma tarefa do dia a dia - até que se torne um
hábito.
Quando se sentir mais confiante, inicie trajetos maiores. Imponha dez
diferentes destinos em ordem crescente de dificuldade: padaria,
supermercado, trabalho e assim por diante.
Não se assuste com a continuação de alguns sintomas, a exemplo de
taquicardia, boca seca ou mãos trêmulas. Eles tendem a diminuir com o
tempo e a prática.
Não prove nada a ninguém para evitar aumentar as expectativas e, consequentemente, a ansiedade.
Convide um amigo para acompanhá-lo apenas se ele for calmo e não privar sua liberdade como motorista.
Se o medo impede que você comece sozinho, peça ajuda a um profissional.
Fonoaudióloga travou depois de estancar carro várias vezes
O medo de
dirigir veículos é mais comum do que se imagina, mas nem sempre os
sintomas são relacionados a fobia, segundo João Bosco de Assis Rocha,
psicólogo e professor aposentado da Universidade Federal do Pará (UFPA).
Ele afirma que cerca de 95% das pessoas que buscam ajuda para dominar a
dificuldade são mulheres, na faixa etária de 39 a 59 anos. A maioria
das pessoas que tiveram o aprendizado facilitado de alguma forma tendem a
desenvolver esse problema com mais frequência. Mas o machismo, o baixo
poder econômico e traumas relacionados a acidentes de trânsito são
outros fatores apontados pelo psicólogo.
Há pouco mais de um ano a
fonoaudióloga Renata Freitas, 26, tirou a carteira nacional de
habilitação (CNH). Como não possuia veículo próprio, às vezes dirigia os
carros do pai ou dos irmãos. Ela conta que naquela época não tinha
medo, só falta de prática. "Até que um dia fui levar uma amiga ao
aeroporto e deixei o carro estancar várias vezes. Na hora, o nervosismo e
a vergonha das pessoas que estavam olhando a cena me neutralizaram e
parei de dirigir por meses. Fiquei insegura, tinha receio de provocar
algum acidente ou mesmo passar por outros constrangimentos", conta. "No
final do ano passado ganhei um carro, mas ele só ficava na garagem.
Mesmo com muita vontade de dar umas voltinhas, sempre vinha um frio na
barriga e o coração acelerava só de me imaginar no trânsito. Há quase
dois meses a fonoaudióloga decidiu buscar ajuda especializada e recebe
apoio psicológico em grupo e aulas práticas no trânsito.
Casos têm que ser vistos indivualmente, afirma psicólogo
João Bosco
Rocha explica que essas dificuldades possuem vários níveis e que cada
caso precisa ser avaliado individualmente. "No programa que coordeno já
orientamos pessoas que necessitavam apenas de mais prática ao volante,
então foram encaminhadas a instrutores. Por outro lado, grande parte das
pessoas que nos procuram obtiveram aulas práticas com instrutor ou
praticaram sozinhas, mas não foi o suficiente". O psicólogo destaca que
na maior parte das vezes a insegurança é causada por falta de melhor
aprendizagem, treino e avaliação.
A contadora
Gilmara Oliveira, 33, lembra que tirou a carteira de habilitação há
cinco anos e logo comprou o tão sonhado carro. Mas teve que deixá-lo na
garagem de casa por um bom tempo, porque não conseguia dominar o medo.
"Quando eu pegava no volante, batia uma insegurança enorme, eu tinha
medo de bater nos outros carros e por isso não conseguia dirigir. Como a
loja que eu trabalho fica na (rodovia) BR-316, quem dirigia para mim
era uma prima ou um colega do trabalho. Com o tempo, fui dirigindo em
ruas pequenas, mas só de pensar na BR já entrava em pânico", diz.
Gilmara não chegou a procurar
assistência psicológica. Ela passou a observar uma senhora que ia todos
os dias entregar comida para os funcionários na empresa onde trabalha, e
que também tinha medo de ruas movimentadas. Mas ainda assim dirigia
porque tinha força de vontade e precisava levar os alimentos. "Minha
prima falava que eu precisava perder o medo, mas eu não conseguia. Foi
quando conheci a dona Antônia. Pensei, se ela consegue, por que eu não
posso conseguir também? Então comecei a encarar o meu medo e dirigir até
o trabalho. Com o tempo eu fui superando e hoje dirijo até para outros
municípios. Agora sei que é possível conseguir isso sozinha, basta que a
pessoa tenha confiança em si mesma, se sinta segura e nunca pare de
treinar", afirma.Postado pelo o Jornal Amazônia
Edição de 04/08/2013
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