sábado, 10 de agosto de 2013

Quem tem medo da limitação de mandatos?


 
A política não é uma profissão. É uma pena que nem todos pensem assim.
Em Portugal demasiadas vezes se constroem imbróglios jurídicos para tentar subverter decisões e escolhas políticas. Aprovam-se leis mal construídas que esvaziam o seu próprio significado político. Ao invés da clareza do debate e da decisão política, constroem-se leis cujas fronteiras podem dar a possibilidade de que as próprias leis não se possam cumprir. Foi também assim com a Lei da Limitação de Mandatos. Construiu-se um consenso no parlamento e na sociedade em torno da ideia de que o exercício de cargos públicos deve ter um limite, deve ser rotativo, coletivo e partilhado. Ou seja, para responder à profissionalização da política, à eternização dos lugares e à fulanização da representação pública trabalhou-se e aprovou-se uma lei que cria regras de limitação e rotatividade de mandatos. 
Ganho esse debate e esse consenso na sociedade, esperava-se agora que os partidos políticos levassem a lei para a prática política e cumprissem o critério da rotatividade de mandatos, ou seja, não candidatassem nas eleições autárquicas nenhuma pessoa que já tivesse cumprido três mandatos consecutivos. A ideia era clara e as suas intenções eram justas. Mas PS, PSD, CDS e PCP decidiram não cumprir a lei e voltam agora a apresentar os seus candidatos dinossauros que saltam de autarquia em autarquia para tentar contornar a lei. 
Agora que era preciso provar que o consenso no parlamento se traduz na prática política, o Bloco de Esquerda é o único partido que contínua a defender o conteúdo e as intenções da lei aprovada no Parlamento. Por uma questão democrática e de decência, o Bloco impugnará todas essas candidaturas que não cumprem a lei. Para o Bloco a limitação de mandatos nunca foi uma manobra parlamentar para dar ar de boa graça, nem muito menos uma decisão forçada para não dar uma imagem de fechamento ao que chamam “classe política”. Para o Bloco a limitação de mandatos foi sempre uma escolha política clara e um compromisso com a democracia. Dessa escolha e desse compromisso não estamos dispostos a abdicar por nenhum motivo instrumental. É uma batalha democrática para levar a sério, até às suas últimas consequências. 
Levar a Democracia a sério é isto: defender integralmente o sentido político da legislação que aprovamos e fazê-lo ainda com mais força quando é a nós que nos tocam as leis, quando é a nós que a democracia exige responsabilidade. É por isso triste de ver (mas não de aceitar) que PS, PSD, CDS e PCP insistam em apresentar candidatos que já exerceram três mandatos consecutivos em juntas e autarquias e que agora são candidatos noutras autarquias e juntas vizinhas apenas para poderem continuar nos cargos que ocupam. A política não é uma profissão. É uma pena que nem todos pensem assim. É uma pena que estes partidos não queiram levar a democracia a sério quando viram o parlamento aprovar uma lei cujo objetivo era limitar o exercício de cargos públicos e agora se aproveitam da suposta falta de clareza jurídica para, de forma nada democrática, tentarem subverter o espírito da lei. 
Muito se tem dito e escrito sobre a crise das instituições, dos partidos e da representação política. A limitação de mandatos era neste aspecto uma proposta intocável de resposta a essa crise. Permitia dar um sinal à sociedade de que as instituições e os partidos não se querem fechar sobre si mesmos em lógicas de perpetuação do poder e que, pelo contrário, iriam fazer um esforço pela partilha de responsabilidade, rotatividade na representação e maior controlo democrático sobre a representação política. Assim, contribuíram para uma prática política mais democrática, transparente e que prevenia muitas formas de compadrio e corrupção. 
Alguns escolheram não levar esta batalha a sério. Mas esta batalha acabou de começar. A Democracia exige que a façamos e sobretudo que a vençamos. 
Sociólogo. Dirigente estudantil. Dirigente do Bloco de Esquerda

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