quarta-feira, 13 de março de 2013

Tailândia: 3º lugar na violência contra a mulher

Tailândia: 3º lugar na violência contra a mulher

Divulgado há duas semanas, o Mapa da Violência 2010 apresentado pelo Instituto Sangari trouxe uma surpresa: o município de Tailândia, no Pará, figura em terceiro lugar nacional, com uma taxa de 128,4 homicídios. O pódio indesejável traz o alerta de que a interiorização da violência é um fato crescente. Os dados foram coletados a partir de 2003. Tailândia também ocupa o terceiro lugar como o município brasileiro mais violento contra as mulheres. A taxa de homicídio foi de 17,8, entre os municípios cuja violência contra a mulher é mais intensa.
Conhecido por ter crescido com disputas ferrenhas pelo desmatamento e uma relação forte com o trabalho escravo, Tailândia se tornou um município masculinizado, no mau sentido, onde as mulheres ainda não garantiram o espaço devido na sociedade. O DIÁRIO passou um dia na região e constatou que a violência está presente no cotidiano das pessoas, mesmo que de uma forma inconsciente. As sequelas, no entanto, são bem visíveis.

Na porta da delegacia de Tailândia, a mãe de Israel da Cunha esperava a possibilidade de visitar o filho preso. Israel matou a ‘companheira’ Alessandra com várias facadas no quintal da casa da irmã dela, num bairro da periferia de Tailândia, há dois meses. O motivo: ciúmes. Certo de que estava sendo traído, o vaqueiro atacou Alessandra com uma faca. O primeiro golpe foi no pescoço. “Meu filho era um homem direito. Estragou a própria vida com uma mulher que não merecia”, diz a mãe.

Inverte-se o sentido. A vítima é quem matou. Não quem morreu. “A violência contra a mulher aqui parece ser uma coisa cultural. Às vezes, nem precisa de motivo. Basta a bebida”, diz o delegado Paulo Renato, às voltas com nove inquéritos recentes que têm a violência contra a mulher como pano de fundo.

Na delegacia, Mariana Franco Cardoso, 20 anos, esperava ser atendida. Ia prestar queixa contra o ex-marido, que a ameaçou de morte caso tentasse se aproximar da filha de quatro anos, que vive com o pai. “Ele me xingou, me chamou de vagabunda e disse que ia me matar se eu fosse lá de novo”, relata Mariana.

Denunciar ainda é um problema ser resolvido em Tailândia. “Temos casos de cárcere privado, mas as mulheres evitam denunciar”, diz Telma do Socorro, coordenadora do Centro de Referência Especializada de Assistência Social de Tailândia. “O correto era ter uma delegacia específica de mulheres”, diz.

LAÇOS DILACERADOS

A violência destrói famílias inteiras. Não é apenas a mulher que morre. No início do ano, Regina Célia dos Santos, 52 anos, mãe de nove filhos, quase todos adolescentes, recebeu quatro tiros, seis facadas, várias pauladas e foi estuprada num matagal de uma vicinal de Tailândia. O corpo, abandonado, foi descoberto apenas três dias depois. Jordércio Pereira dos Santos, 22 anos, guarda as roupas, as bolsas e até o brinco que a mãe usava no dia em que foi morta. Como homenagem, tatuou o nome de Regina no próprio peito. “Ela estava com os dois braços quebrados. Jogaram produto químico no rosto dela. Fizeram muita maldade com minha mãe”, diz ele. A família se esfacelou depois da tragédia.

Dois homens foram presos. Um está foragido. Mas Jordércio acha que o mandante não foi preso. O próprio pai. “É difícil dizer isso, mas acredito que foi ele”, afirma.

“Aqui ninguém se mete. Ninguém quer saber”, diz um taxista, explicando por que as pessoas evitam falar dos casos de violência que ocorrem na cidade. Muitas vezes, o silêncio é a única saída para quem sofre a perda de alguém querido.

Motivos vários, histórias diversas: banalidade é a regra

Carmen Gomes Maciel, 46 anos, parece ter envelhecido dez anos desde que a filha foi assassinada com um tiro na cabeça pelo homem com quem ela vivia. Carmen ainda tem a foto da filha emoldurada num quarto. Maria Luduina Maciel da Silva tinha 14 anos. “Ela se envolveu com um homem possessivo, ciumento, que batia nela, embora ela negasse. Quando vi minha filha morta, jogada com a metade do corpo debaixo da cama, eu não acreditei”, diz ela.

A mulher, mãe de outros três filhos, desistiu de lutar. “Eu não tenho mais o que fazer. Não posso sair matando. O que ele fez um dia vai voltar contra ele”, diz Carmen. O acusado está foragido.

Os parentes das vítimas sentem que a Justiça é estranha em muitos casos. Vanessa tinha 16 anos quando foi morta no início do ano. O principal acusado, Cosme José da Silva, o ‘Gavião’, argumentou que havia encontrado a companheira numa rede, depois de haver enforcado a si mesma com um cinto. A polícia considerou as provas inconsistentes para prendê-lo. No início do mês, ‘Gavião’ foi preso acusado de abusar sexualmente de duas meninas.

Na Vila Macarrão, considerado um dos bairros mais violentos de Tailândia, Creuza Silva da Conceição, 37 anos, ainda guarda uma sequência de fotos macabras da filha, morta aos 15 anos, de forma inexplicável para a mãe. “Minha filha entrou numa gangue. Foram as próprias colegas dela que fizeram isso com ela. Tenho certeza”, diz, enxugando as lágrimas.

Mesmo sem querer fazer referência específica a um caso em particular, a psicóloga Adelma Pimentel, que estuda a questão da violência privada, afirma que no Brasil ainda há regiões, como o Norte e o Nordeste, com uma forte cultura patriarcal. “Ainda se validam aqueles papéis tradicionais, onde os homens não veem as mulheres como um outro e sim como um objeto que possam dispor”, explica. É o que pode estar ocorrendo em Tailândia. (Diário do Pará)

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